Suprimentos em xeque

Os fabricantes de materiais só se convenceram da solidez do aquecimento da construção civil no segundo semestre de 2007. De lá para cá, muitos investimentos foram anunciados e alguns segmentos já começam a responder com o aumento da produção. Mas dado o descompasso entre o ritmo de expansão do número de obras e da cadeia de fornecimento de insumos, que demanda aportes maciços e a certeza de demanda em longo prazo, a pergunta do momento é: vai faltar material?
Em geral, as indústrias estão confiantes no abastecimento da construção civil neste ano. No entanto, são raras as que não estão operando em capacidade próxima do limite. Além disso, essa confirmação da oferta, por parte das indústrias, é pautada no crescimento de 10,2% previsto para a construção em 2008.
Caso o mercado se comporte acima do esperado, como em períodos do ano passado, pode haver desabastecimento.A indústria de cimento, por exemplo, apesar de ter anunciado o maior orçamento de investimentos em aumento da capacidade (cerca de R$ 4,5 bilhões para os próximos cinco anos), deve crescer exatos 10% em 2008, valor precisamente igual à ampliação estimada da demanda do insumo para 2008.
O maior risco, nesse caso, é que a procura se expanda a taxas superiores às previstas ou que ainda apresente picos de aquecimento em períodos de manutenção e de desligamento de máquinas, como ocorrido em agosto de 2007, quando faltou cimento.Em contraposição, há a dificuldade, da própria indústria, em precisar o volume da demanda da construção civil.
"Se viéssemos de um ciclo de crescimento baseado no passado, conseguiríamos fazer uma projeção [da demanda] mais acertada, mas estamos vivenciando uma situação sem precedentes", diz Marcio Chamma, diretor da Votorantim Cimentos. Melvyn Fox, presidente da Abramat (Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção), tem visão semelhante. "Apesar de termos muito mais informações do que há três anos, ainda não conseguimos saber quantas novas unidades são iniciadas mensalmente, e esse dado é extremamente relevante, porque a gente sabe o efeito multiplicador de uma habitação e isso pauta as empresas", diz.
Problemas no curto prazo:
Problemas no curto prazo:
Em sondagem realizada em janeiro pelo Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), 57% das empresas de material de construção e da indústria de transformação que responderam à consulta informaram que não poderão atender a todas as encomendas neste ano (contra 39% em 2007). Ainda assim, em 2008, as empresas de materiais de construção devem apresentar a menor taxa média de expansão de capacidade produtiva (9%) dentre a indústria de transformação, que engloba ainda bens de consumo, bens de capital e bens intermediários.Por outro lado, o abastecimento no médio prazo está garantido: 70% afirmaram que o investimento na ampliação da capacidade produtiva será motivo para não ocorrer falta de produtos nos próximos dois anos, quando a capacidade da indústria de materiais deverá crescer 28%.
"Poucas indústrias têm condição de expandir a capacidade rapidamente, só se tiver capacidade ociosa", explica Ana Maria Castelo, consultora da FGV. Ela acredita que 2008 será o ano mais crítico para o suprimento de materiais. "Este ano vai exigir mais organização de todos os lados, da oferta e da demanda, porque a indústria não está plenamente capaz de atender a todo o crescimento da construção, e a construção precisa sinalizar, com mais precisão, o quê e quando vai necessitar." Segundo pesquisa da Abramat, 63% das empresas de acabamento consultadas pretendem fazer investimentos nos próximos 12 meses, enquanto 57% das companhias de materiais de base têm essa pretensão. "A intenção da indústria de base foi mais alta em março de 2007 (chegou a picos de 81% e permaneceu até julho), porque são as primeiras impactadas pelo aquecimento da construção civil", diz Melvyn Fox, da Abramat. O pico dos materiais de acabamento foi em julho de 2007, quando a intenção de investimento foi mencionada por 76% das empresas consultadas. "Num cenário de crescimento ao redor de 10%, não haverá falta de material ou nenhum problema de atendimento à demanda neste ano", afirma.
As indústrias cimenteiras estão trabalhando no limite, enquanto as siderúrgicas garantem que não haverá desabastecimento; em comum, ambas prevêem aumentos de preços
Preços em alta:
A maioria dos fabricantes consultados já prevê reajuste de preço de seus produtos. E, nesse caso, a máxima "quanto maior a demanda, mais caro o produto", não vale. Nenhum entrevistado atribuiu à pressão da demanda interna o motivo para a elevação dos preços dos produtos. As indústrias afirmam que o motivo é a alta dos valores das matérias-primas, como o minério de ferro, petróleo, cobre etc. "O aumento da procura só resultaria em aumento de preços se não houvesse capacidade produtiva. As indústrias querem ganhar em volume, não em valor", completa Melvyn Fox.
A Sondagem Conjuntural da Indústria de Transformação do Instituto Brasileiro de Economia e da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) apurou que 39% dos empresários entrevistados em abril demonstraram a intenção de encarecer seus preços no segundo trimestre deste ano, enquanto apenas 6% apontaram a possibilidade de queda. O motivo é a pressão do setor metalúrgico, que estaria forçando alta dos custos de produção. Segundo a pesquisa, 74% das indústrias metalúrgicas devem aumentar suas tabelas de preço já este mês, pressionando toda a cadeia da construção civil.Em recente seminário do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo) - "Insumos da Construção: Desafios do Crescimento" -, esse impacto foi confirmado. Em geral, os produtos derivados do aço, dos metais não-ferrosos (alumínio e cobre) e do plástico (derivado do petróleo) apresentam aceleração nos preços devido à alta das commodities no mercado internacional.
"A indústria de materiais de construção e, por conseqüência, os construtores, têm motivos para se preocupar em relação à sua cadeia de preço, porque os próprios insumos estão sendo alvos de aumentos", disse a coordenadora do estudo, Ana Maria Castelo.
Como mostra o balanço, a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) anunciou aumentos entre 8% e 13% no preço do aço bruto e prevê novos reajustes no início deste mês, assim como a Usiminas. A Vale anunciou aumento de preço no minério de ferro (muito utilizado na fabricação de aço e, conseqüentemente, de vergalhões e de fôrmas) de 70%. Há ainda perspectiva de aumento nos contratos internacionais de carvão (que impacta o setor de cerâmica e de aços longos) entre 130% e 150%. O preço de algumas commodities como o cobre (diretamente ligado ao segmento de fios e cabos, e louças e metais) no mercado externo deverá continuar em alta. O barril do petróleo (que impacta quase todos os setores, entre eles, cimento, louças e metais, tintas, fôrmas, vidro, fios etc.) continuará acima de US$ 100 em 2008 (a previsão é de que cairá para até US$ 65 apenas no fim de 2009).
Já as tarifas de energia apontam para um cenário mais favorável, devendo subir abaixo da inflação em 2008.Isso sem contar o aumento considerável da mão-de-obra, responsável por cerca de 50% do custo na construção, e que tem contribuído para a elevação de todos os índices relativos às despesas do setor. Ana Maria Castelo adverte que "exagerando a possibilidade do aumento do preço, é provável que as empresas comecem a importar alguns materiais". Mas isso, segundo ela, também traria problemas como adequação às normas.
fonte: Revista Construção e Mercado
Contribuição:Eng Renato Camacho
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