O Aproveitamento dos Recursos Hídricos e o Desenvolvimento Sustentável

O Brasil detém, desde 1997, uma das mais avançadas legislações em termos de política e de gestão dos recursos hídricos. Essa forma de ver a água incorporou novos paradigmas ao modelo setorial e fragmentado que era praticado no passado recente. Até então, cada utilizador se apropriava do recurso a seu bel prazer, com interesses específicos de sua atividade sem se preocupar com necessidades básicas e prioridades, ou com o abastecimento doméstico ou com a manutenção da qualidade desse bem.
O modo de agir sobre a água em forma de aproveitamento dos recursos hídricos cede cada vez mais espaço para o modo de olhar baseado no conceito de desenvolvimento sustentável , pelo qual, além de se considerarem os usos múltiplos, integrados e harmônicos, possibilitam a cada setor e usuários a internalização de seus papéis na conservação e na efetiva participação em práticas que dêem perenidade à oferta segura, em quantidade e qualidade.
As ações mais imediatas que se espera do país é que haja a universalização da oferta de água potável e que toda a população brasileira, hoje em 184 milhões de habitantes, tenha oferta eqüitativa em seus domicílios – uma dotação em padrão de potabilidade entre 80 e 180 litros por habitante por dia.
Outra questão a ser resolvida é a de atendimento das moradias de cerca de 92 milhões de brasileiros com sistemas de coleta de esgotos sanitários, uma das maiores deficiências do país. É preciso também dar atenção ao maior problema e desafio, que é a falta de tratamento dos esgotos domésticos. Atualmente, somente 28 % dos esgotos sanitários gerados são tratados.
A falta de acesso à água potável de parte da população e às redes de coleta e de tratamento dos esgotos sanitários, em nível compatível com a capacidade de assimilação e depuração dos corpos hídricos receptores, tem levado a que cerca de dois terços das internações hospitalares sejam por motivos associados à falta de água ou a contatos com águas em padrões inadequados. Os indicadores das principais entidades vinculadas ao setor de saúde indicam que os custos de prevenção e de oferta de sistemas seguros de saneamento básico são de longo alcance e custam cerca de um quarto das medidas de remediação com os atendimentos médico-hospitalares.
Outro aspecto importante e que deve ser resolvido no país são as ocupações territoriais irregulares e desordenadas pela inexistência de planos diretores e de cumprimento de legislações, o que compromete áreas de recarga de berçários de águas. Apesar de tratados nas esferas dos três níveis de governo – federal, estadual e municipal –, o tema não deixa de ter sua base na iniciativa privada, que insiste em gerar loteamento inviáveis do ponto de vista da sustentabilidade. O imediatismo dos "empreendedores" de olhar viciado e interesseiro cria uma situação de difícil solução tanto para atual como para as futuras gerações.Quero destacar, o que julgo seja a essência do que o Brasil deve fazer para garantir o fornecimento de água para as próximas gerações, focando a Lei nº 9.433 de 1997. O documento instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e definiu cinco instrumentos de suporte à sua implementação: o sistema de informações; os planos; os enquadramentos dos corpos de água; a outorga e a cobrança pelo uso dos recursos hídricos.O mais importante é associar a esses instrumentos outros que levem em consideração os principais promotores de mudanças – as pessoas, os agentes que lidam com a vegetação, o solo e as águas, as bases hídricas.O aspecto humano deve ser considerado pelo país como o mais importante, adotando-se a educação integral no campo hídrico, associada à educação ambiental, à sensibilização e ao conhecimento sobre as questões vinculadas à disponibilidade de água.
Com o avanço educacional, haverá a abertura de nosso olhar de forma mais consciente sobre o recurso e sobre o seu valor intrínseco como elemento essencial à vida. Assim, entenderemos que a nossa água interior – já que somos 72% água – só estará bem quando as nossas águas exteriores também estiverem em bom estado.* Demetrios Christofidis é professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da Universidade de Brasília (UnB). É doutor em Recursos Hídricos pela mesma instituição e autor de diversos livros sobre o tema, entre eles Olhares sobre a Política de Recursos Hídricos do Brasil : O caso da bacia do rio São Francisco (CDS, UnB). Atualmente, é presidente da Câmara Técnica de Ciência e Tecnologia do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (Ministério do Meio Ambiente).
Autor: Demetrios Christofidis
Fonte: Agência Unb
Fonte: Agência Unb
Comentários
Postar um comentário