Gestão lean de fornecedores: histórias reais

No relacionamento com fornecedores, alguns dos indicadores mais importantes são: entrega, qualidade e custo. Vamos relatar três histórias reais do novo tipo de relacionamento com os fornecedores que a gestão lean traz para lidar com problemas nessas três dimensões.
ENTREGA. O que fazer quando um fornecedor não entrega e a produção do cliente para?
Um fornecedor depende de um pequeno item importado para poder entregar seu produto final, um complexo subsistema de um produto final muito amplo. Apesar dos estoques de segurança e dos planos alternativos de abastecimento, uma situação climática muito especial no país de origem desse componente aliada a problemas de TI fez com que esse elemento, aparentemente pouco relevante, causasse a parada da produção da empresa-cliente.
Qual foi a atitude dessa empresa-cliente? Antes de qualquer coisa, exigiu-se que a verdade fosse dita, ou seja, que se definisse claramente quando e como os componentes chegariam. Reconhecido o fato de que isso implicaria a parada de produção, o pessoal da empresa-cliente alertou para a necessidade da empresa-fornecedora reconhecer o problema, esperando que o próprio presidente da empresa levasse o material – que, devido ao tamanho, cabia em uma caixa a ser colocada no porta malas de um carro – pessoalmente até a fábrica do cliente, quando seria recepcionado pelo próprio presidente da empresa-cliente. Ao receber as peças, o presidente da empresa-cliente leva o presidente da empresa-fornecedora a sua fábrica para que ele perceba a parada na produção e, além disso, solicita explicações dos motivos que levaram ao ocorrido. Após o uso de alguns porquês, o presidente da empresa-cliente solicita um conjunto de ações para evitar que isso aconteça novamente. Ademais, ele pede que em um mês o presidente-fornecedor retorne à empresa para mostrar as ações implementadas.
QUALIDADE. O que fazer quando o fornecedor apresenta sérios problemas de qualidade?
Uma empresa-fornecedora de um componente químico de elevado conteúdo tecnológico recebe reclamações de um cliente. A não resolução do problema fez com que fosse solicitada a presença do fornecedor na planta que utilizava esse insumo. O presidente da empresa-fornecedora disse que enviaria o diretor de qualidade. A empresa-cliente não aceitou essa sugestão, pois se tratava de um problema gravíssimo e que como tal deveria ser visto de uma maneira mais séria. Ao argumentar do seu pouco conhecimento sobre o complexo tema e dizer que o diretor de qualidade estaria melhor capacitado, o presidente-cliente retrucou questionando como era possível que o presidente-fornecedor tivesse esse cargo se não era capaz de entender e resolver um problema fundamental para o cliente. Vencido, o presidente-fornecedor vai até a planta-cliente, localizada em um país vizinho. Ao chegar lá, ficou surpreso ao ver uma enorme quantidade de análises e investigações feitas pela matriz do cliente. Após perguntar como eles tinham todas essas análises – que nem mesmo o fornecedor possuía –, o cliente afirmou que como era um processo fundamental para os clientes finais, eles tinham que conhecer.
Então, o presidente-cliente solicitou uma análise detalhada o mais rápido possível por parte do fornecedor para identificar a causa do problema, assim como as medidas de contenção que seriam avaliadas por sua equipe técnica.
CUSTO. O que acontece quando o fornecedor não reduz os custos conforme esperado?
Uma empresa define como uma das cláusulas contratuais a redução de preços de 5% a cada ano. Um fornecedor novo dessa empresa, acostumado a solicitar aumentos de preços e não a dar reduções, vê-se surpreendido com a aplicação da cláusula. Para que isso acontecesse, o presidente da empresa-fornecedora foi chamado ao cliente, fato raro até então no relacionamento com outros clientes. Chegando lá, foi recebido com a simples pergunta do cliente de quais ações tinham sido implementadas para permitir a redução dos preços. Surpreso, o presidente-fornecedor diz que esse era um assunto operacional e que ele teria que chamar o VP de operações ou o diretor de finanças. Essa afirmação também deixou o cliente surpreso pelo desconhecimento do presidente-fornecedor. O cliente, então, definiu que a redução automática de preços não seria aplicada até que o fornecedor mostrasse as melhorias efetivas que permitiram a redução de custos. O cliente não estava interessado em simplesmente reduzir os custos penalizando as margens do fornecedor sem que houvesse melhorias efetivas.
Essas três histórias nos mostram que a relação de confiança é primordial. Em nenhum momento, nesses casos, o cliente intimidou ou ameaçou o fornecedor. Nem mesmo levantou eventuais multas contratuais. Ao contrário, colocou-se ao seu lado, procurando entender cientificamente o problema e ajudar na sua resolução.
Por outro lado, fica evidenciado o papel da liderança, que deve assumir diretamente a responsabilidade e adotar a atitude gemba de "ir ver com seus próprios olhos". Quando problemas graves acontecem, os presidentes precisam estar engajados, não para buscar culpados, mas para entender os problemas e buscar a solução conjuntamente.
E além de confiar no fornecedor, o cliente precisa conhecer profundamente seus próprios processos e os processos dos fornecedores para não desapontar os seus clientes finais.
A gestão lean dos fornecedores significa a redefinição do relacionamento tradicional baseado em desconfiança, distância e na visão dos fornecedores como meros custos para uma visão de fornecedores como importantes agregadores de valor e de ajuda para realizar melhorias e inovações. O interesse pelo sucesso e sobrevivência do fornecedor no longo prazo deve ser um dos objetivos dos clientes.

José Roberto Ferro Presidente
Lean Institute Brasil

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